DIVERSOS

Coluna do Consultor

Reforma da Previdência e direito adquirido
Autor: Antônio Augusto de Queiroz

A Proposta de Reforma da Previdência preserva o direito adquirido? Esta tem sido a pergunta mais freqüente nos debates que tenho participado sobre o tema.

Sempre tenho respondido, de acordo com o texto proposto, que o direito adquirido – entendido como aquele cujas exigências para seu exercício já foram atendidas, seja para a aposentadoria proporcional ou integral – está preservado, podendo seu titular fazer uso dele, com base na legislação que o adquiriu, independentemente de mudanças posteriores.

Apesar da interpretação (a meu juízo equivocada) que alguns Tribunais de Contas têm dado ao direito à aposentadoria proporcional – segundo a qual o servidor que, de posse desse direito, resolvesse continuar trabalhando por cinco ou mais anos e, portanto, alcançasse o tempo (apenas o tempo) para a integral, não poderia mais optar pela proporcional, ainda que lhe fosse mais vantajosa – continuo sustentando que o servidor será o senhor do momento de exercer o direito adquirido e, se eventualmente reunir condições para adquirir outro direito, poderá optar pelo mais benéfico.

Em situação similar, o Supremo Tribunal Federal (RE 278718 – DJ 14.06.2002), por intermédio do ministro Moreira Alves, relator da matéria, assim se pronunciou a respeito do tema:

“Com efeito, esta Corte de há muito firmou entendimento de que o trabalhador tem direito adquirido a, quando aposentar-se, ter os seus proventos calculados em conformidade com a legislação vigente ao tempo em que preencheu os requisitos para a aposentadoria, o que, no caso, foi respeitado, mas não tem ele direito adquirido ao regime jurídico que foi observado para esse cálculo quando da aposentadoria, o que implica dizer que, mantido o quantum daí resultante, esse regime jurídico pode ser modificado pela legislação posterior, que, no caso, aliás, como reconhece o próprio recorrente, lhe foi favorável. O que não é admissível, como bem salientou o acórdão recorrido, é pretender beneficiar de um sistema híbrido que conjugue os aspectos mais favoráveis de cada uma dessas legislações”.

De fato, quem – antes da mudança de 1998 (Emenda 20) ou durante sua vigência – completou ou vier a completar as condições para requerer a aposentadoria proporcional (cinco ou menos anos antes da integral) fará jus a aquele direito e poderá exercê-lo depois, ainda que reúna as condições para aposentar-se por tempo de contribuição, não perdendo o direito a opção ao que lhe seja mais favorável. O que não pode é, na determinação do valor da aposentadoria, na hipótese de mudança no critério de cálculo, montar um benefício híbrido, tendo que utilizar por completo um ou outro sistema, garantindo-se ao servidor o mais benéfico.

Se não fosse assim, uma servidora com tempo para requerer aposentadoria proporcional adquirido antes da Emenda 20 (quando o requisito para aposentadoria proporcional era apenas de 25 anos de serviço, se mulher, ou 30, se homem, sem exigência de idade mínima) e que poderia exercer esse direito independentemente da idade, resolvesse continuar trabalhando e não requeresse sua aposentadoria proporcional antes de completar o tempo para a integral (30 anos, mais o pedágio), perderia o direito à proporcional e, caso não tivesse a idade mínima que passou a ser exigida pela Emenda 20, teria que ficar trabalhando até completar os 48 anos. Isso seria um absurdo.

Ora, se a hipótese anterior fosse verdadeira, um servidor ou servidora que tivesse direito à aposentadoria proporcional antes da Emenda 20 e ficasse sem exercer esse direito por mais de cinco anos até a vigência da PEC 40 – que introduz alterações mais drásticas que instituiu a Emenda 20 – perderia o direito à aposentadoria proporcional e teria que esperar até preencher o novo requisito da idade mínima e aposentar-se com provento inferior ao da aposentadoria proporcional, pelo simples fato de não haver requerido seu direito antes de completar o tempo da integral. Realmente seria trágico.

Se há esse tipo de interpretação – seja na união, nos estados ou nos municípios – compete ao governo federal, autor da proposta de reforma, por intermédio dos Ministérios da Previdência e do Planejamento, esclarecer a todos os órgãos e esferas de governo a interpretação correta, sob pena de corrida às aposentadorias proporcionais ou utilização indesejada do Judiciário, aumentando despesas e criando constrangimento para os assalariados do setor público.

O que o texto diz, o faz sem deixar dúvidas, é que o servidor ou servidora que houver preenchido os requisitos para se aposentar, integral ou proporcional, antes da vigência da nova PEC, terá seu direito adquirido preservado e será isento da contribuição (inclusive na hipótese de ela ser instituída para os aposentados e pensionista) enquanto estiver trabalhando.

Portanto, se algum servidor ou servidora preencheu ou vier a preencher os requisitos de tempo (25 anos mais o pedágio, para mulher, e 30 anos mais pedágio para homem) e, após a Emenda 20, idade (48 anos para mulher e 53 para homem) para requerer aposentadoria proporcional na vigência da Emenda 20 e resolver continuar trabalhando após a eventual aprovação e promulgação da PEC 40, não perderá esse direito, podendo fazer uso dele mesmo depois de reunir condições para aposentar-se com base nas novas regras, se lhe for mais vantajoso.

Deste modo, ainda que discorde do conteúdo da reforma – notadamente na ausência de regra de transição, na adoção do redutor para a pensão, no cálculo do provento pela média, da contribuição do inativo e do fim da paridade – devo reconhecer que a Proposta do Governo Lula, diferentemente da proposta inicial de FHC, reconhece o direito adquirido, o que, evidentemente, não tira dela o viés fiscal nem elimina a grande injustiça para com os atuais servidores ativos. É por isso que defendo mudanças no texto.