POLITICA

Pesquisa Sindical 2002 mostra perfil atual do mundo do trabalho

Maria Lúcia de Santana Braga, 19/11/2002

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou no último mês de outubro os primeiros resultados da Pesquisa Sindical ano-base 2001. Em convênio com o Ministério do Trabalho e Emprego, o levantamento foi realizado no primeiro semestre de 2002, com o objetivo de mapear a dimensão, a estrutura e a evolução do mundo sindical na década de 1990.

Entre 1986 e 1992, o IBGE realizou periodicamente a Pesquisa Sindical, que abrangia os sindicatos brasileiros urbanos e rurais, de empregados e empregadores e ainda os profissionais liberais e trabalhadores autônomos. O Censo Sindical 2002 retomou os levantamentos sobre esse setor com fim de atender a demanda cada vez mais expressiva por informações detalhadas sobre o movimento sindical brasileiro recente.

De imediato, os dados iniciais apresentados indicam duas mudanças significativas no mundo do trabalho da década de 1990: a fragmentação cada vez maior da identidade do trabalhador e as novas formas de trabalho advindas das inovações tecnológicas. Ou seja, o trabalhador não é mais o operário que trabalha numa indústria, com carteira assinada, vive em um espaço determinado e produz bens materiais. Atualmente, o trabalhador moderno pode ser tanto o prestador de serviço, o trabalhador informal ou, então, aquele que trabalha à distância, em casa, sem vínculos imediatos com o espaço da indústria ou do escritório, um produtor de bens materiais e simbólicos. Dessa forma, são várias identidades que representam inserções diferenciadas no mundo do trabalho.

A segunda mudança, que está diretamente ligada à primeira, decorre das inúmeras inovações tecnológicas surgidas nas últimas duas décadas com a diminuição drástica dos trabalhadores, em especial da indústria e do setor bancário, conforme apontado pelos resultados da pesquisa a seguir. Os sindicatos dessas categorias foram duramente atingidos nesse período com a diminuição do seu poder de pressão e negociação, em função dos maciços investimentos tecnológicos e, conseqüentemente, redução dos contingentes de trabalhadores. No entanto, o sindicato ainda é visto como uma instância relevante na organização dos trabalhadores segundo nota-se pela relativa estabilidade da taxa de sindicalização nos anos 1990. Tais pontos estão intimamente relacionados com o denominado processo de "modernização" da economia e das relações trabalhistas no País ocorrido de forma mais intensa com o início do governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995. Segundo o estudo do DIEESE intitulado A Situação do Trabalho no Brasil, a década de 1990 é um marco na história das relações do trabalho, devido a profundas modificações, como o aumento do desemprego e dos vínculos trabalhistas instáveis, e à concentração de renda.

Outro aspecto que chama a atenção na pesquisa é que as entidades sindicais de trabalhadores ainda não consideram prioritária a associação a entidades de assessoria técnica como o DIAP e o DIEESE, devido a dificuldades variadas, mesmo que essas entidades tenham cumprido relevante papel nas últimas duas décadas. O levantamento inicial não chegou a detalhar os motivos envolvidos nesse ponto. Confira a seguir uma síntese dos principais resultados da Pesquisa Sindical 2002.

Âmbito da Pesquisa Sindical e Coleta de dados

O IBGE investigou os sindicatos formados até 31/12/2001, a partir dos seguintes instrumentos: a) carta de reconhecimento no Ministério do Trabalho, a chamada carta sindical; b) registro sindical no Ministério do Trabalho; c) registro em cartório; e d) registro em cartório e pedido de registro sindical no Ministério do Trabalho. O levantamento foi feito em sindicatos de trabalhadores e empregadores por meio de questionário e entrevistas com representantes sindicais.

Primeiros dados da Pesquisa Sindical

O movimento sindical brasileiro passou por amplas e inúmeras dificuldades na década de 1990, devido tanto ao processo de enfraquecimento das entidades representativas com a redução da taxa de filiação, de forma mais intensa em categorias atingidas pelas inovações tecnológicas, como também pela revisão dos instrumentos de pressão e negociação coletiva. Não há dúvida que essas dificuldades, detectadas pela pesquisa, são fruto do processo de inserção periférica, política e econômica pelo Brasil e pela América Latina, decorrente do predomínio de orientações liberais e neoliberais, segundo a ótica apresentada no início desse artigo.

Evolução da estrutura sindical - Em relação a esse tópico, a pesquisa detectou que o peso das entidades rurais diminuiu em relação às urbanas, com o crescimento médio de 43% dos sindicatos urbanos em relação aos últimos dados coletados em 1991.

O crescimento mais expressivo foi o dos sindicatos de trabalhadores autônomos: 307%. Com certeza, isto reflete o crescente aumento do trabalho informal no país com a redução dos postos de trabalho assalariado.

Apesar do crescimento do número de sindicatos de cerca de 79% na Região Norte e de 71% na Região Centro-Oeste na última década, o Sudeste e o Sul continuam tendo o maior percentual de entidades sindicais no País. Em relação à base territorial, predominam as entidades sindicais de base municipal com 53%.

Sindicatos de trabalhadores - A pesquisa procurou mapear os principais grupos profissionais segundo os setores econômicos. A mudança mais significativa é que o sindicalismo do setor industrial e de empresas de crédito e bancárias sofreu uma redução considerável devido em particular às inovações tecnológicas.

Por outro lado, os sindicatos de servidores públicos tiveram crescimento de 180,3% nos últimos dez anos, em grande parte devido ao direito de organização sindical reconhecido pela Carta de 1988. Além dos servidores públicos, as entidades de trabalhadores em transportes terrestres e de trabalhadores em educação e cultura tiveram um crescimento relevante nesse período.

Quanto à representatividade dos grandes grupos profissionais, permanecem em primeiro lugar os trabalhadores na agricultura com 39% do total; em seguida, os trabalhadores na indústria com 21%; e os servidores públicos em terceiro lugar com 15%, posição essa ocupada em 1991 pelos empregados no comércio, que agora obtiveram 13%. Já em relação ao tamanho das entidades sindicais, segundo a Pesquisa Sindical, 12% são considerados pequenos (abaixo de 100 associados), e 39% são grandes sindicatos, que têm mais de 1.000 associados.

Representação sindical - O número de associados a sindicatos de trabalhadores cresceu de forma absoluta 27,3% entre 1990 e 2001. Tendo em vista a taxa de sindicalização a partir da População Economicamente Ativa (PEA), definida em 1999 em 79.315.287 pessoas, houve um pequeno decréscimo de 5,2%. Já em relação à População Ocupada (PO), ocorreu o crescimento de 0,8%. Isso indica, segundo os analistas do IBGE, relativa estabilidade da taxa de sindicalização na década de 1990.

Associação sindical e técnica - Cerca de 83% dos sindicatos são filiados às federações e 69% às confederações. Em relação às centrais sindicais, o percentual passou de 30% em 1991 para 38% em 2001.

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) congrega o maior número de sindicatos filiados, com 66% do total; seguida pela Força Sindical (FS), com 19%; a Social-Democracia Sindical (SDS), com 7%; a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), com 6%, e, por último, a Central Autônoma dos Trabalhadores (CAT), com 2%.

Já a filiação dos sindicatos a entidades de assessoria técnica, como o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), o Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Socioeconômicas (DIEESE) e o Departamento Intersindical de Estudos da Saúde do Trabalhador (DIESAT), é ainda pouco significativa.

Sindicatos de empregadores - A mudança mais relevante em relação aos sindicatos de empregados mapeados pela pesquisa é o aumento da representação do grupo de comércio que passou a ocupar a segunda posição em 2001, em substituição à indústria, agora na terceira posição. O grupo econômico representado pela agricultura permanece em primeiro lugar com o maior número de sindicatos de empregadores.

Relacionamento entre empregados e empregadores - A greve como o mecanismo de pressão ou instrumento de luta perdeu força nessa última década, dando lugar às negociações e outras formas de relacionamento, com pautas voltadas para a manutenção do emprego e de direitos adquiridos.

Maria Lúcia de Santana Braga é socióloga, doutora em Sociologia pela UnB e assessora parlamentar do DIAP. E-mail:lucia@diap.org.br

Fonte: Análise Política do Diap-Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar